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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Rádio Peão. Conhece?


Em Comunicação Empresarial, especificamente na comunicação interna voltada aos funcionários da organização, nos deparamos com a chamada "rádio peão". Alguns profissionais da área de comunicação a vêem como uma grande inimiga, outros como um mal sem fim e outros preferem pensá-la como sendo uma lenda. O fato é que ela funciona perfeitamente no dia-a-dia de muitas empresas independentemente da opinião dos seus executivos.

Na prática sabemos o que é uma "rádio peão", mas é possível teorizar sobre ela? Entendemos que sim e esta é a nossa proposta aqui. Ainda que de maneira rápida, pretendemos apontar alguns pontos para reflexão desta ação com a finalidade de projetá-la, justificá-la e/ou revisá-la.

Pensando o objeto, é necessário definir o que é uma "rádio peão". De uma maneira simplista, podemos entendê-la como as manifestações comunicacionais não controladas que correm pelo caminho da informalidade dentro das organizações. Pensemos agora na definição a partir das palavras. O substantivo feminino "rádio" significa a entidade na qual transita todo e qualquer discurso. O adjetivo "peão" carrega implicitamente um pré-conceito provavelmente acrescentado para descaracterizar a entidade, já que "peão" está ligado a "chão de fábrica", "serviçal" e "pessoa sem instrução". Assim, "rádio peão" traduzida ao pé-da-letra significa os discursos manifestados por funcionários incultos do baixo escalão. Se isso algum dia fora verdade, hoje sabemos que não tem validade alguma, pois os discursos correm por toda a teia organizacional, via comunicação intrapessoal e o moderno correio eletrônico, do chão de fábrica ao céu de brigadeiro da alta administração.

Embora o termo "rádio peão" esteja consumado, apresentamos uma opção em tempos modernos: "boato organizacional". Boato todos sabemos bem o que é, ou por vítima, ou por participação ativa na sua disseminação, ou pela escuta. Para ampliar o conceito, tomamos de ORLANDI (2001, p. 135) algumas considerações sobre boato: "é um fato substantivo da história, fato de sua relação com o silêncio"; "produz um efeito de verdade a partir de palavras não asseveradas" (:136); existe onde "há disputa pelo sentido" (:142) e não há "um responsável do dizer, mas uma figura fantasmática que toma o lugar de sua responsabilidade. Desde que se manifesta um autor socialmente visível, o boato não é mais boato" (:137).

Vemos aqui o boato organizacional como a saída para o silêncio da comunicação formal. Silenciar sobre um assunto não significa eliminá-lo, a comunicação -discursos e sentidos - busca o seu curso, ainda que à margem. Cabe aos profissionais responsáveis pela comunicação criar canais para dar voz e vez aos funcionários e evitar que falas com toda sorte de acréscimos e entendimentos se tornem verdades.

Na "disputa pelo sentido" (:142), a empresa perde porque é uma contra muitos e, o que é pior, com diversos sentidos. Alguns profissionais da área de comunicação aliados a gerentes que nada entendem de pessoas, buscam a qualquer custo responsáveis pelo dizer. Ignoram que o sujeito, por princípio, é fantasmático, que a locução é audível, mas é pirata. O identificável é que, independentemente do locutor (sindicatos, líderes oposicionistas, funcionários, ongs, etc.), é um dizer que surge do silêncio. Quem silencia, cala, consente e sente!

Não podemos deixar de registrar, no entanto, os dizeres plantados. Optamos por "dizeres" no lugar do "boato" porque, como diz ORLANDI, ao ser identificado, o "boato não é mais boato" (:137). Esses dizeres correm com ar de desautorizados mas têm fonte conhecida, profissionais (??!!) de comunicação e (in)gerentes que "plantam" a informação em alguns "laranjas" e esses, loucos por demonstrarem que são "amigos do rei" reproduzem o discurso. São informações sobre demissões principalmente e outras reduções mesquinhas, que têm como finalidade desestabilizar o grupo (e depois dar-lhes treinamento sobre trabalho em equipe!) e evitar reclamações e/ou reivindicações.

Outra questão a ser levantada é sobre o sujeito. Quem são os sujeitos e por que eles atuam? Os sujeitos são os funcionários que, como dissemos, não encontram nos canais formais de comunicação maneiras de manifestação e não se sentem seguros para emitirem opiniões ou discutir questões por verem a possibilidade de retaliação por parte da empresa. Encontramos também no "boato organizacional" funcionários escondidos por vergonha de manifestar-se.

Quais as implicações do boato na vida organizacional? É possível afirmar que o maior problema é a desmotivação, e um funcionário desmotivado pode representar queda na produtividade (a demanda está em alta mesmo!), maior número de acidentes de trabalho (não sabem usar os "EPIs"!), produtos com defeito (dá-lhes treinamento sobre qualidade!), divulgação negativa (haja verba para trabalhar a imagem!), rotatividade (tem gente boa no mercado!) entre tantas outras implicações que refletem diretamente nos resultados da empresa.

A solução? Podemos dizer que é imprescindível pensar a comunicação de uma maneira democrática, participativa. Nesse sentido, entender o "boato organizacional" como a necessidade de estreitar a relação empresa-funcionário, ao contrário de apenas mal dizê-lo e criar canais de comunicação que possam atender aos vários públicos internos: produção, administração de nível médio, alta administração etc. Em tempos de alta tecnologia e globalização, a solução pode estar no óbvio: comunicação intrapessoal, através de gerências com competência e habilidades para liderar pessoas. Por fim, recorremos a BUENO (2003, p. 13), é preciso pensar a Comunicação Empresarial de forma estratégica, respaldada "em bancos de dados inteligentes, em um conhecimento mais profundo dos seus públicos de interesse, dos canais de comunicação", apoiando-se "em metodologias, em pesquisas," e "na necessidade imperiosa de dotar a Comunicação de um novo perfil: a passagem do tático para o estratégico" (:15).

Fonte: BERTUOLO, Claudemir. "Rádio peão": do chão às estrelas, do tático para o estratégico. Disponível em: <http://www.comtexto.com.br/2convicomcciRadioPeaoClaudemirBertuolo.htm>. Acesso em: 26 mar. 2007.